Vale Vêneto

Festival de Inverno e Semana Italiana: um vale imerso em sons, culturas e sabores há quase quatro décadas

Festival de Inverno e Semana Italiana: um vale imerso em sons, culturas e sabores há quase quatro décadas

Fotos: Nathália Schneider (Diário)

Notas musicais enfeitam o pátio em frente à Igreja Matriz de Corpus Christi, onde ocorrem as apresentações de recitais dos professores convidados à noite e dos alunos, ao meio-dia

Sons dos mais variados instrumentos, vindos dos quatros cantos de um bonito vale, misturam-se ao longo do dia, entre si e ao aroma de uma culinária típica. Agrado para os ouvidos e para o estômago. Esse é o cenário que se desenha nos invernos de Vale Vêneto, distrito do município de São João do Polêsine, no centro do Estado.


O espaço quase encantado recebe, simultaneamente, dois festivais importantes para a região: a Semana Cultural de Vale Vêneto e o Festival Internacional de Inverno da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Ambos chegam à sua 38ª edição esse ano. São quase quatro décadas de integração entre música, cultura e gastronomia


Katiussa Zuliana, secretária de Educação, Cultura, Desporto e Turismo de São João do Polêsine, destaca que o clima nublado e chuvoso, encontrado pelos turistas em muitos dias dessa semana, além de fazer jus ao nome do evento, é um atrativo à parte:


– As paisagens de Vale Vêneto falam por si só, não é? Nos preparamos há muito tempo e temos muitas coisas bonitas para ofertar às pessoas que vêm nos visitar. O melhor é valorizar a rica cultura advinda da imigração italiana aqui na nossa região. Nós conseguimos mesclar essa participação da comunidade com a questão musical e cultural.


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ACORDES DO MUNDO

O Festival Internacional de Inverno da UFSM iniciou em 1986, com o objetivo de favorecer o desenvolvimento e o aperfeiçoamento da atividade musical em um ambiente de integração com a sociedade. Assim, diante do potencial turístico da região da Quarta Colônia de Imigração Italiana e do interesse de Vale Vêneto em promover o resgate de suas origens, surgiu a parceria que se mantém até hoje.


A comunidade do distrito idealizou a Semana Cultural Italiana e, desde então, a UFSM, a comunidade de Vale Vêneto e a prefeitura de São João do Polêsine são parceiras na promoção dos eventos.


Nesses 38 anos de existência, além de alunos brasileiros vindos de diversos estados, o festival teve também a participação de alunos e professores da Argentina, Uruguai, Bolívia, Paraguai, Costa Rica, Estados Unidos e Alemanha.



Assim, as salas da Escola Estadual, da Casa de Retiros e do antigo Seminário se tornam espaços de aulas, ensaios e estudos. Cada aluno deve levar seu instrumento musical, partituras e estante. A UFSM disponibiliza pianos e instrumentos de percussão para a orquestra sinfônica.  


Um grande destaque da programação são os recitais dos professores e alunos participantes do festival. A apresentação dos alunos ocorre às 12h, e a dos professores, às 19h, na Igreja Matriz - a única na América Latina dedicada a Corpus Christi. Recitais solo, de música de câmara e da orquestra sinfônica integram a programação. O grande Concerto de Encerramento ocorrerá no dia 30 de julho e será apresentado pelos professores convidados, em Santa Maria, no Centro de Convenções da UFSM.


Os professores Lucas Robatto (flauta) e Ana Flávia Frazão (piano) se apresentam em recital durante o Festival


Um desses professores é Lucas Robatto, docente da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e flautista principal da Orquestra Sinfônica da Bahia (OSBA). Graduado em flauta pela Escola Estatal Superior de Música de Karlsruhe, da Alemanha, Robatto participa pela primeira vez do festival.


– Estou muito feliz de estar aqui nessa cidade incrível com natureza linda e cenários fantásticos. O festival é tão importante e consolidado que me sinto muito confortável e feliz em estar aqui, compartilhar meu trabalho com todos e poder conhecer colegas importantes e alunos talentosos. Felizes são as comunidades que conseguem ter organizações musicais. Isso é um mérito enorme no Brasil e contribui para o desenvolvimento regional.


Para Alan Woo, docente na University of Georgia, dos Estados Unidos, é um prazer tocar piano para uma audiência tão relevante.


– É minha segunda vez participando do festival. É maravilhoso ver tantos estudantes do Brasil e do mundo reunidos nesse belo vale com tanta cultura. Espero poder voltar ano que vem – diz o professor, que já foi elogiado pelo jornal The New York Times como um pianista com muita “segurança e vitalidade”.



Para Clayton Miranda, professor do Departamento de Música da UFSM e membro da comissão organizadora do Festival Internacional de Inverno, foi uma grata surpresa ver a Igreja Matriz praticamente lotada de membros da comunidade, avós, pais, filhos e muitas crianças, durante os espetáculos:
  
São de 250 a 300 pessoas por concerto. É uma programação muito bonita e estamos muito felizes. Trouxemos professores que não são só bons nos seus instrumentos, mas são pessoas incríveis também, que estão agregando ao festival e aos alunos que participam das oficinas ministradas por eles.


O professor relembra que em 2019 o evento estava no auge de sua produtividade, mas veio o revés da pandemia da Covid-19 em 2020. No ano seguinte, ele ocorreu de forma remota, e, em 2022, retornou ao modo presencial, mas com muitas restrições. Na 38ª edição, a grande notícia: os números de 2019 estão de volta. São 15 oficinas de música e uma média de 180 vagas para alunos e membros da comunidade.


– Tem uma troca, uma movimentação muito grande. É muito legal ver uma pessoa, vamos dizer assim, leiga em música, na plateia, que depois do concerto vem conversar conosco e perguntar a diferença entre os instrumentos e compositores. O benefício e a retribuição que o curso de Música e a UFSM deixam plantados na comunidade e na região de Vale Vêneto é uma coisa muito prazerosa. Vemos isso nos olhos de todos os envolvidos com o Festival – finaliza Clayton Miranda.


Para a animação do público, a Nonna desfila entre as mesas lotadas para mais uma noite de jantar italiano com bife á milanesa


'MANGIA CHE TE FA BENE'!

Em paralelo ao Festival Internacional de Inverno da UFSM, ocorre a Semana Cultural Italiana. O evento atrai muitos turistas em busca da famosa gastronomia do país europeu, dominada pelos imigrantes que aqui se instalaram. Por dia, mais de mil pessoas lotam dois salões e um anexo em Vale Vêneto para o almoço e, sobretudo, um grande jantar, servido às 20h30min.


E a estrela do cardápio é o bife à milanesa, prato que surgiu, como diz o nome, em Milão, na Itália, em 1148 e se tornou popular na América Latina. Ele é feito com bife de carne bovina, temperado e frito em óleo quente após serem empanados com ovos batidos e farinha de rosca.


Para alimentar o grande público que vai até o distrito em busca da iguaria, são produzidos 350 kg de bife por dia. Mas não para por aí. Para acompanhar, uma tonelada de sopa de agnoline – outro clássico italiano – é produzida ao longo da semana, e mais de 5 mil pãezinhos são assados diariamente.


Mais de 1 tonelada de sopa de agnoline é preparada ao longo dos oito dias de evento. 350 kg de bife à milanesa são produzidas por dia.


Conforme Thomas Bortoluzzi, coordenador da 38ª Semana Cultural Italiana, o sucesso do bife é tanto que, este ano, foram cinco noites com a iguaria:


– Nós começamos a servir, antes da pandemia, com uma única noite do bife, e as pessoas nos pediram muito. Hoje estamos com cinco noites, todas lotadas. Nós também estamos inovando, nesta edição, com exibição gratuita de filmes italianos que não são encontrados em plataformas de streaming. Temos shows, com destaque para o ítalo-gaúcho Délcio Tavres. E esse clima de inverno atrai o público para tomar um bom vinho, com uma boa conversa. Todos os caminhos conduzem à Vale Vêneto!

COMUNIDADE

E para servir 1.600 pessoas em uma noite lotada são necessários mais de 150 voluntários, a maioria nascidos e criados na comunidade, descendentes de imigrantes italianos. Com simpatia e muita agilidade, eles trabalham para que nenhum item do cardápio fique sem reposição sobre as grandes mesas. Um desses voluntários é o engenheiro civil Fernando Dotto. Desde que “se conhece por gente”, ele participa das atividades da festa que celebra a cultura, a gastronomia e a história de sua família e do local onde nasceu.


– Meu pai e avô moram aqui, então venho todo os fins de semana. Eu não lembro de não participar das celebrações. Ajudamos na paróquia, aqui na comunidade e acabamos conhecendo as pessoas e interagindo. É um prazer e uma diversão, não é um trabalho. Na 38ª edição, eu destaco essa união da comunidade, que parece cada vez maior – conta Dotto.

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