
Fotos: Beto Albert (Diário)
O que Santa Maria, Santiago, Passo Fundo e Rio Grande têm em comum? A comunidade de cada um desses locais aguarda melhorias no transporte coletivo por meio da prometida licitação, como no caso dos santa-marienses, que esperam por mais de 50 anos, desde 1970. E em algumas vezes, nem é por falta de tentativa, como Santiago, que lançou licitação, mas não obteve nenhuma oferta. Em Passo Fundo e Rio Grande, as concorrências também foram feitas, mas não tiveram sucesso. Mas o que leva à licitações desertas e manutenção de contratos emergenciais?
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Representantes do setor de transporte indicam que esses resultados sofrem influência do número de passageiros, do valor de serviço e das obrigações das empresas feitas na licitação, o que exige um alto investimento. E ao se falar de valores, esse cenário soa arriscado. Pelo menos é o que os exemplos dos últimos anos apresentam.
Em Passo Fundo, o transporte coletivo vem sendo debatido desde 2013. Entre 2017 e 2020, duas licitações foram lançadas, mas anuladas. A terceira tentativa deve ser feita ainda este ano, promete prefeitura do Norte do Estado.
Os 48,9 mil habitantes de Santiago, na Região Central, também não viram a licitação do transporte público resolver o problema, quando foi lançada em 2023. Como nenhuma apresentou proposta, nem mesmo a que atuava na cidade, a Viação Centro Oeste teve que continuar a prestar o serviço após intervenção judicial do município. A prefeitura recorreu ao Ministério Público para que a Centro Oeste continuasse a transportar os passageiros, mesmo sem licitação.

O município de Rio Grande está fazendo um projeto para licitar. Mas essa não é a primeira vez. Em 2014, foi a primeira concorrência pública, que foi anulada. Quatro anos depois, tentaram mais duas vezes, mas nenhuma empresa quis. Em 2019, houve falha no processo e não chegaram a publicar o edital. Já em 2020, a licitação foi lançada, mas acabou suspensa. Atualmente, um consórcio com duas empresas atuam no município.
O que as empresas pensam?

Na visão da empresa, assumir o serviço exigiria uma boa segurança jurídica, com uma legislação municipal consistence e, da mesma forma, com investimento público por meio do subsídio, para diminuir o valor da passagem. E, claro, rentabilidade. Esses são os pontos apresentados pelo diretor da Associação dos Transportes Urbanos (ATU), que oferta o serviço em Santa Maria, Edmilson Gabardo.
– Se formos pensar em Santa Maria, seria quase R$ 300 milhões de investimento para começar a operar após licitação. Se você colocar esse valor no mercado financeiro, esse risco é bem menor e o retorno maior. Tudo tem que ser analisado. E o número de exigências feitas também é um dos motivos das licitações darem deserto – complementa Gabardo, também associado a Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU).
A redução de passageiros
O número de passageiros é parte importante na conta final da licitação, principalmente porque quantitativo vem caindo gradativamente, mesmo após a pandemia de Covid-19. Conforme as pesquisas do Laboratório de Mobilidade e Logística da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), os usuários gaúchos são altamente insatisfeitos, principalmente quando analisam o serviço versos o preço da tarifa. Nos dados do laboratório avaliando só Santa Maria, 61% dos usuários de Santa Maria acham a tarifa inadequada visto a qualidade do transporte coletivo desde o embarque até o destino.
– A fidelização e satisfação do usuário é muito importante para que não percamos e tenhamos novos usuários. Quando há insatisfação, há um circulo vicioso e isso afeta para que essas empresas vejam desvantagens econômicas no contrato – explica o coordenador do projeto em Santa Maria, Alejandro Ruiz Padillo.

Na perspectiva de políticas públicas, o transporte coletivo deve ser pensado como investimento. Ruiz pondera que ao melhorar e atender mais pessoas, consequentemente, melhora a qualidade de vida não só daqueles que utilizam ônibus, mas de toda a população.
O que vai mudar com a licitação de Santa Maria
Atualmente, seis empresas prestam o serviço em Santa Maria. Com a licitação, uma única empresa ou consórcio assumiria por 20 anos. O município ainda não lançou a licitação. Também não é conhecido quanto o passageiro passaria a pagar após essa mudança, mas se sabe que a empresa que assumir deve cumprir uma lista de exigências, com a possibilidade de o valor da passagem subir ou precisar de mais subsídio para conter o aumento. Leia o edital de licitação completo no site da prefeitura.
O que está previsto na futura licitação
- Unificação das tarifas urbanas e distritais
- 30% dos ônibus com ar-condicionado
- Novas formas de pagamento da tarifa (cartões de crédito, débito e QR Code)
- Ônibus com câmeras de videomonitoramento interno
- Novo aplicativo para monitoramento dos horários de ônibus
- Corredores preferenciais de transporte coletivo em vias prioritárias (Avenida Presidente Vargas, Rua Riachuelo e Rua André Marques)*
- Terminais centrais para embarque e desembarque na Avenida Rio Branco*
*São investimentos do poder público, ainda sem data exata para ocorrer, pois devem ser implementados de forma gradual
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O valor da tarifa

Com a licitação o valor da tarifa aumenta? Em Santa Maria isso ainda não está colocado, mas a indicação do setor é que haja alteração no valor.
Lajeado é um exemplo de licitação já concluída e empresa operando desde 2020, quando a Expresso Azul de transporte S/A assumiu o transporte coletivo após 30 anos de contratos emergenciais. O município tem 93,6 mil habitantes. Da abertura do processo licitatório até que a empresa assumisse, o processo demorou um pouco mais de 1 ano.
A proposta de tarifa foi R$ 3,93, com taxa de administração de serviço e 1%. Mas em 2024 esse valor não é mais o mesmo. Na última atualização do site da prefeitura de Lajeado, a tarifa passou para 5,75 em março. E ela poderia ser maior, mas o poder público também paga o subsídio de R$ 1,10 por passagem de ônibus. No total são cerca de R$ 1,6 milhão ao ano. O subsídio é realizado desde 2022.
Na época da licitação lançada em Santiago, a ideia era que a empresa atuaria pelos próximos 10 anos. No início, seriam seis veículos atuantes em 13 itinerários. O estudo indicou que a passagem chegaria a R$ 7,16. Em 2023, a tarifa era de R$ 3,30.