Falar de câncer de próstata é, também, falar de sexualidade. Decidir não tratar o tumor por medo de disfunção erétil é um erro com alto custo: a própria doença, quando progride, pode danificar nervos e vasos responsáveis pela ereção, causando perdas iguais ou maiores que aquelas associadas aos tratamentos. Ensaios robustos do Reino Unido (ProtecT), publicados no New England Journal of Medicine, mostraram que cirurgia, radioterapia e até a vigilância ativa têm perfis diferentes de impacto na função sexual ao longo do tempo; por isso, a escolha terapêutica deve ser individualizada e informada, não regida pelo medo.
+ Receba as principais notícias de Santa Maria e região no seu WhatsApp
As diretrizes europeias (EAU) reforçam que qualidade de vida e desfechos sexuais devem fazer parte da conversa desde o diagnóstico, com explicitação dos riscos e das estratégias de preservação da função erétil, incluindo técnicas cirúrgicas poupadoras de nervos, ajustes de dose/campo na radioterapia e manejo dos efeitos da hormonioterapia. O objetivo é tratar o câncer sem “abandonar” a vida sexual do paciente.
Em centros como Memorial Sloan Kettering e Johns Hopkins, estudos observacionais e revisões mostram que a probabilidade de recuperação erétil após prostatectomia varia conforme idade, comorbidades, função prévia e experiência da equipe; técnicas de preservação neural e avaliação rigorosa de margens são determinantes. A análise de séries contemporâneas destaca melhora dos resultados ao longo da última década, mas com grande heterogeneidade entre pacientes – razão extra para planejamento individual.
Depois do tratamento, a mensagem é clara: quase todos os homens que desejam recuperar sua vida sexual podem ser ajudados. Programas de reabilitação peniana – com inibidores de PDE5 (como sildenafil/tadalafil), dispositivos a vácuo, tração peniana e, quando necessário, injeções intracavernosas ou prótese – têm racional fisiológico e evidências crescentes, sobretudo quando iniciados precocemente após cirurgia poupadora de nervos. A literatura ainda é heterogênea, mas aponta benefícios funcionais e de preservação de tecido erétil em protocolos estruturados; ensaios e revisões conduzidos ou reportados por Mayo Clinic e grupos acadêmicos internacionais sustentam essa prática.
Outro ponto essencial é a educação do casal. Conversar com o paciente e, quando ele desejar, com sua parceira ou parceiro sobre expectativas, cronograma de recuperação, efeitos colaterais e alternativas terapêuticas reduz ansiedade, melhora adesão e encoraja soluções graduais: de fármacos e dispositivos a intervenções definitivas, como a prótese peniana, que oferece alta satisfação quando bem indicada. Diretrizes recentes de saúde sexual reiteram a necessidade de anamnese específica, uso de questionários validados e acompanhamento multiprofissional.
Concluindo...
Tratar o câncer de próstata e preservar a vida sexual não são objetivos incompatíveis. Com informação de qualidade, equipes experientes e um plano de reabilitação precoce, é possível curar o tumor – ou controlá-lo de modo seguro – e, ao mesmo tempo, proteger a intimidade e o bem-estar do paciente. O convite é para que essa conversa aconteça cedo, com transparência e base científica, em qualquer serviço, do consultório à sala cirúrgica.