

"Se não repensarmos o consumo, vamos entrar para a lista de extinção". Disse Ailton Krenak para o auditório lotado do Colégio Marista Santa Maria na noite de domingo (7). Nas poltronas, crianças, jovens, idosos e estudantes acompanhavam atentamente à fala do escritor, ambientalista, filósofo e líder indígena mineiro no "Livro Livre", espaço da programação da 50ª Feira do Livro de Santa Maria.
Mais cedo, Krenak recebeu a imprensa para uma agradável conversa, onde relembrou sua participação na 48ª Feira do Livro de Santa Maria. Na época, devido ao isolamento imposto pela pandemia da Covid-19, o bate-papo foi virtual.
– Eu gosto de Santa Maria. Eu estive na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) há 15 anos atrás para um evento rápido e fiquei pensando: eu ainda quero voltar aqui com calma. E desde a minha participação virtual, a Liciane [Brun, da organização da 50ª Feira do Livro] tem feito um esforço pessoal de me pescar para estar de forma presente aqui novamente. Estou muito feliz de visitar de novo Santa Maria e também encontrar tantos autores e leitores que estão prestigiando esse evento. Agradeço a acolhida no espaço "Livro Livre", que é essa ideia tão bacana, de a literatura proporcionar outras experiências e da liberdade narrativa de encontros – falou o renomado escritor, ambientalista e filósofo indígena de 69 anos.

Desde sua marcante participação na Assembleia Constiuinte, em 1987, quando pintou o rosto com a tinta preta do jenipapo em protesto contra o retrocesso nos direitos indígenas, Krenak se destaca como um dos mais importantes pensadores brasileiros sobre as temáticas ambiental e dos povos originários. Ailton conta que o livro "Ideias para adiar o fim do mundo", por exemplo, foi o começo de uma viagem que passa por "A vida não é útil", onde faz uma crítica política real a situação que o Brasil está vivendo nessa década:
– Eu fico admirado, às vezes, em como essas ideias que me ocorrem sobre meio ambiente, ecologia, política, sociedade e educação se articulam. E fico feliz de poder oferecer para os jovens, para essa meninada que está em fase de formação, alguma referência para eles pensarem a vida e uma ideia de viver melhor no mundo.

REFERÊNCIA
Representantes de diversas etnias e segmentos indígenas estavam presentes no auditório do Colégio Marista Santa Maria para ouvir o pensador contemporâneo. Entre eles estava a Roseni Mariano, de 36 anos, formanda do curso de Odontolgia da UFSM. Ela é natural da reserva indígena Guarita, que fica na região noroeste do Estado. O local abriga o maior contingente de população Kaingang do Brasil.
– Não é surpresa que ele é uma referência para nós e para os defensores dos direitos dos povos originários do Brasil. Eu vim prestigiar ele hoje que é uma oportunidade que não se pode desperdiçar. É muito gratificante ter uma pessoa assim como ele aqui na nossa região. Ler o Krenak também demonstra o quão rica é a nossa cultura e coloca um pouco as pessoas no nosso mundo – disse Roseni.

Em determinado momento da conversa, Ailton Krenak arrancou risos e aplausos do público ao apontar que o senador gaúcho Hamilton Mourão (Republicanos) seria um "pós-índio", uma vez que alternou sua autodeclaração racial de branco para indígena (e vice-versa) em várias oportunidades ao longo das eleições. Para Krenak, o Rio Grande do Sul é mal representado pelo senador.
O público acompanhava, muitos com os livros do autor em mãos, as longas reflexões do filósofo, que também falou sobre a invisibilidade dos povos indígenas em Santa Maria e mencionou outros pensadores e escritores como Mahatma Gandhi, Conceição Evaristo e Carlos Drummond de Andrade.

Para a secretária de Cultura, Rose Carneiro, a presença de Krenak na Feira do Livro de Santa Maria demonstra a dimensão do evento:
– Ele já esteve na feira virtualmente e tinha afirmado que gostaria de vir presencialmente. É uma alegria para nós estar aqui com o auditório lotado para ver e ouvir esse pensador, mesmo com a chuva incessante. Temos uma programação muito legal até o final da feira, que tem atraído bastante público em todas as atividades. Isso significa que estamos no caminho certo.
O espaço "Livro Livre" ainda recebe os portugueses Afonso Cruz, no dia 9, e Pedro Lamares, no dia 10, e a escritora e tradutora gaúcha Natália Borges Polesso no dia 12. Todos os bate-papos ocorrem no Theatro Treze de Maio, às 19h. A 50ª Feira do Livro de Santa Maria encerra no dia 13 de maio.