Foto: Maria Júlia Corrêa
A ocupação indígena caingangue na área da antiga Fepagro, no distrito da Boca do Monte, completou três semanas na última terça-feira (5). O fato foi tema de uma audiência de conciliação, na tarde desta sexta-feira (8), na sede da Justiça Federal, no Bairro Nossa Senhora das Dores, em Santa Maria. Em frente à sede, manifestações: de um lado, pais e responsáveis de alunos da Emei Boca do Monte, que são contra a realocação de alunos para um outro espaço – uma vez que a escola fica dentro da área da Fepagro –, e de outro, grupos e movimentos sociais que apoiam a retomada caingangue. Mais de 100 pessoas estavam presentes.
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Nessa audiência, estiveram presentes representantes do MPF, da Procuradoria-Geral do Estado, da Procuradoria-Geral do Município, da própria comunidade indígena, da Funai e da Defensoria Pública da União. O objetivo foi dar início a um processo de diálogo e conciliação dentro da esfera judicial sobre esse aspecto.
De acordo com informações divulgadas pela prefeitura, a proposta de conciliação levantada na audiência foi de que o Estado realize um estudo, em um prazo de 30 dias, para indicar a disponibilidade de concessão provisória de uma área de 15 hectares da área da antiga Fepagro para conceder à comunidade indígena. Os processos foram suspensos até uma nova audiência de conciliação. Além disso, a prefeitura deve analisar, em conjunto com as equipes de segurança e comunidade escolar, a retomada das aulas na Emei Boca do Monte.
Enquanto a reunião ocorria, pais e alunos da Emei Boca do Monte, com faixas e cartazes, ocuparam uma parte do local, para manifestar o descontentamento com a ocupação e a realocação temporária das crianças para a Escola Estadual Almiro Beltrame, que fica no mesmo distrito, para que as aulas do 2º semestre letivo sejam retomadas. Os vereadores Tubias Callil (PL) e Lorenzo Pichinin (PSDB) estiveram no local e manifestaram apoio aos moradores da Boca do Monte.
Os responsáveis que estiveram na manifestação contra a ocupação afirmaram ao Diário que, após reunião com a direção da escola, na tarde de quarta-feira (6), ficou acertado que as aulas iniciariam na próxima segunda (11). Porém, foram categóricos ao afirmar que não levariam os filhos até o novo espaço. Eles alegam que o tempo de deslocamento para a nova escola é demorado e aumentaria em até 40 km de distância, além de questionar a adaptação das crianças a um local considerado diferente.
Já na calçada, mas também em frente à sede da Justiça Federal, representantes do Diretório Acadêmico dos Estudantes (DCE), do Programa de Educação Tutorial (PET) Indígena, profissionais da educação, entre outros grupos e movimentos sociais, marcaram presença favoráveis aos indígenas. Com faixas escritas "Não à retirada da escola e sim à retomada da terra indígena, indígena não é invasor", defendem que o grupo caingangue fique no local, em alinhamento com a retomada do funcionamento da Emei. A vereadora Alice Carvalho (PSol) também esteve presente no local.
O advogado do grupo caingangue, Gabriel de Oliveira Soares, reforçou ao Diário, na terça-feira, que "o processo de retomada indígena não tem qualquer interferência na volta às aulas e na realocação dos estudantes para outra escola". Também pontuou que não deseja que as pesquisas desenvolvidas no local sejam interrompidas, e negou que tivesse ocorrido qualquer situação conflituosa no espaço.
Enquanto pais gritavam "devolvam nossa escola", o grupo que apoia o ocupação indígena ecoava "fica escola e também a retomada". Apesar dos ânimos exaltados em determinados momentos em decorrência do coro de cada uma das partes, não foram registrados transtornos. Uma equipe da Brigada Militar esteve no local fazendo o patrulhamento.
Como foi a audiência de conciliação
O encontro encerrou no fim a tarde desta sexta. Segundo informações divulgadas pela prefeitura de Santa Maria, " a audiência buscou uma solução para duas ações judiciais sobre o tema". O Executivo municipal reforçou que lideranças da comunidade caingangue se comprometeram a não interferir nas atividades de pesquisa do Estado na área e manifestaram o desejo de que a escola retome suas operações o mais breve possível.
"A proposta de conciliação levantada na audiência foi de que o Estado realize um estudo, em um prazo de 30 dias, para indicar a disponibilidade de concessão provisória de uma área de 15 hectares da área da antiga Fepagro para conceder à comunidade indígena. Os processos foram suspensos até uma nova audiência de conciliação. A prefeitura se comprometeu a avaliar, em conjunto com as equipes de segurança e comunidade escolar, a retomada das aulas na EMEI Boca do Monte. A comunidade indígena também assumiu o compromisso de não aumentar o número de pessoas e famílias ocupantes na área até a consolidação de um acordo."
Processos na Justiça
Haviam dois processos em andamento sobre o caso: a ação de reintegração de posse movida pelo Estado, para que o grupo saia do local, e uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o Estado por conta do descumprimento das recomendações que o Ministério Público Federal expediu para que fossem adotadas tratativas e diálogos humanizados ao lidar com os indígenas caingangues. Os dois processos tramitavam na fase conciliatória, na 3ª Vara Federal de Santa Maria.
De acordo com o procurador-geral do município, Guilherme Cortez, o encontro desta sexta abordou as duas ações, já que os processos são conexos. Então, ambos foram suspensos até uma nova audiência de conciliação.
Primeira manifestação foi realizada na terça
No dia em que a ocupação completou três semanas, pais se reuniram em frente da sede da Fepagro, na tarde de terça-feira, para protestar contra a realocação temporária das aulas e atividades da Emei Boca do Monte para a Escola Estadual de Ensino Fundamental (EEEF) Almiro Beltrame. Em torno de 100 pessoas estiveram no local. Saiba aqui como foi.
Situação da Emei Boca do Monte
Em nota divulgada na segunda-feira (4), a Secretaria de Educação informou que, em prol da segurança dos estudantes e servidores, as aulas da Emei Boca do Monte serão temporariamente transferidas para a Escola Estadual Almiro Beltrame, no mesmo distrito. A medida valerá enquanto a situação da ocupação não for definida. O retorno das aulas no novo local está previsto para a próxima segunda-feira (11).
A instituição atende 80 alunos, de 1 a 5 anos, do Berçário 2 ao Pré-B. A instituição foi desocupada no dia 15 de julho, quando um grupo de 30 indígenas da etnia caingangue entrou no local e ocupou uma parte do espaço. Como não houve avanços nas tratativas ou realocação do grupo de indígenas para outro espaço, a direção optou por adiantar o início do recesso escolar para o dia 21 de julho, enquanto as demais escolas do município entraram em férias no último dia 23.
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