Foto:Vinicius Becker (Diário)
As ruas do Balneário Passo do Verde, às margens da BR-392, em Santa Maria, viraram rios. Pela segunda vez em menos de dois meses, a elevação do nível do Rio Vacacaí inundou a comunidade, forçando pelos menos 21 famílias que ali vivem a uma rotina de isolamento e adaptação. Onde no verão o cenário é de descontração, com sombra e água fresca, hoje é de água batendo no primeiro piso das residências de dois andares, além de um cotidiano onde o único meio de transporte é o barco.
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A equipe do Diário percorreu a localidade alagada nesta segunda-feira (25) à bordo da embarcação de Júlio Araújo, 49 anos. Morador do balneário há quatro anos, Araújo, que é natural de Canoas, tornou-se uma espécie de transportador para os vizinhos, usando seu barco para buscar compras, transportar pessoas e garantir que a vida, mesmo ilhada, continue.

– Aqui é a avenida, aqui vai para a praia – aponta Júlio, enquanto navega por cima do que antes era a via principal. A profundidade, segundo ele, chega a quatro metros em alguns pontos.
A cena se repete a cada curva do "rio" que se formou: casas cercadas por uma água barrenta, o silêncio quebrado apenas pelo motor do barco.
Uma rotina de adaptação

Para os moradores do Passo do Verde, a inundação já se tornou um evento previsível. A preparação é a chave para minimizar os prejuízos.
– Aqui todo mundo já sabe, as casas são todas preparadas para inundar a parte de baixo. O que temos embaixo é pouca coisa, fácil de levar lá para cima. Vamos acompanhando a água subindo – explica Júlio.
Os carros são retirados e deixados na beira da rodovia. A comunicação é feita por um grupo de WhatsApp, onde os pedidos de ajuda são constantes. Durante o trajeto com a reportagem, um vizinho, usando máscara, precisou ser levado de barco até a BR-392 para conseguir uma carona até Santa Maria para atendimento médico.
– Quem tem barco é para usar. Tem que ser assim, uns ajudando os outros – resume Júlio.
Um problema antigo, uma nova frequência

Se hoje o problema é a água que sobe com uma frequência assustadora, a sensação de abandono no Passo do Verde não é nova. Conforme o Diário mostrou em reportagem de 5 de janeiro deste ano, a comunidade convive com a falta de infraestrutura básica. Na época, moradores relataram que a manutenção das ruas esburacadas e até a compra de postes de luz dependiam de "vaquinhas" entre eles.
Agora, a natureza impõe um desafio ainda maior. A Defesa Civil de Santa Maria monitora a situação e, até a manhã desta segunda, não havia necessidade de remoção de famílias, já que os moradores permanecem nos andares superiores das residências. O órgão, no entanto, deve cadastrar os atingidos como desalojados.
O motivo para a repetição das cheias está nos números. Segundo a BaroClima Meteorologia, com a chuva que atingiu a região entre sexta-feira e sábado, Santa Maria já ultrapassou a média de chuva esperada para todo o ano de 2025.
Para Júlio, que comprou a casa sabendo dos riscos, a situação se tornou parte da vida.
– É normal. Tudo é preparado para a gente viver na água. Eu já comprei sabendo disso. Gosto daqui mesmo com esses alagamentos – conclui, enquanto desvia de um galho submerso, navegando pela rua que um dia foi seu endereço e que, hoje, é o leito de um rio.