O recomeço de quem perdeu quase tudo

Thais Immig

Na casa da agricultora Odneia Buligon, 50 anos, não sobrou quase nada. Alguns utensílios de cozinha e fotos da família parecem simbolizar a tentativa de um recomeço. Um cenário que se repete na Vila Fighera, em Santa Maria. As fortes chuvas registradas no início de maio deixaram residências debaixo d’água e famílias ilhadas. Agora, o momento é de avaliar as perdas e, aos poucos, tentar voltar para casa.

Fotos: Beto Albert

Na Vila Fighera, um dos primeiros locais atingidos pela água em Santa Maria, os dias de sol evidenciam o início de uma reconstrução. Quem passa pelo local, pode observar a tentativa de secar os móveis no pátio, eletrodomésticos fora dos cômodos originais e montes de entulho que já não fazem mais parte das residências. Mais do que isso, ainda é possível notar os rastros das fortes chuvas que insistem em ficar e se manifestam por meio da lama ainda presente no entorno das casas, cercas caídas e a marca da altura da água na parede. 

A casa da Odneia fica na Vila Fighera, Bairro Camobi


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“Foi angustiante, coisa de filme de terror”

Odneia conta que a água começou a invadir as casas na madrugada da terça-feira (30). Ela estava cuidando de um tio no hospital e acompanhava o avanço da chuva a partir de atualizações do marido Márcio Fighera, 55 anos, e da filha Valentina, de 13, que estavam na residência da família. Conforme a agricultora, a situação se agravou quando um dique, que servia como um “muro” para conter a água, rompeu-se.

– Minha família mandava fotos toda hora, mas achei que fosse pouca água. Em uma das fotos que recebi, estava na canela. Quando eu vi que a coisa era grande mesmo, a angústia só aumentava porque eu não sabia onde eles estavam. Eu ligava e eles não atendiam, minha vontade era sair voando para socorrer eles. Foi angustiante, coisa de filme de terror – conta Odneia.

A filha e o marido conseguiram sair, com o auxílio de barcos, apenas com a roupa do corpo e o gatinho da família que foi resgatado por Valentina. Depois de certificar-se de que o restante da família que também mora na vila estava bem, o marido foi até a casa da irmã, no Bairro Camobi.

Quando a água baixou, a família voltou para casa e pôde avaliar as perdas, que foram muitas:

Não consegui recuperar nada. Foi tudo. Geladeira, máquina de lavar, eletrodoméstico… tudo. Amigos vieram ajudar a gente a tirar os entulhos porque não tinha o que salvar. Perdemos nossa vida em segundos. Anos de luta ficaram em um monte de entulho.

Diante das perdas e do receio de novas chuvas, a família ainda não voltou para casa


O receio de voltar para casa 

Odneia conta que, aos poucos, a família conseguiu limpar a casa e retirar os entulhos. A comunidade também tem recebido doações e ajuda de amigos. Mesmo assim, eles seguem na casa da cunhada. Com a previsão de chuva para essa sexta-feira (17) e final de semana, a família ainda tem receio de voltar para casa.

– Estamos vendo como começar porque chove de novo, e daí? Perdemos tudo outra vez? Isso que a gente pensa. Estamos esperando um pouco, para ver, porque tem previsão de chuva – afirma Odneia.


A reconstrução acompanhada de traumas e o resgate das memórias

A família pensa muito em como reconstruir, mas Odneia reconhece que é um processo difícil porque toda vez que a chuva volta vem acompanhada do medo que a água invada a casa novamente. Na quarta-feira (15), ela aproveitou o sol para tentar recuperar alguns álbuns de família com fotos da filha, da infância e dos pais, já falecidos.

Odneia aproveitou o sol para tentar recuperar alguns álbuns de família

Dentro de casa, estão organizados alguns utensílios de cozinha que não foram levados pela água. Já do lado de fora, eletrodomésticos como geladeira e máquina de lavar estão sendo secos na tentativa de conserto. A lama ainda está bem presente no pátio, tanto que o trajeto entre o portão e a casa tem sido feito de bota.

– Perdemos tudo, até as memórias que foram junto com a água. A gente tá assim, anestesiado. Eu chorei muito, choro ainda de noite pensando em tudo que aconteceu. Mas vamos ter que enfrentar. A vida é uma luta, vamos lutar – relata Odenia, emocionada.


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